As estrelas estão a dar em doidas. Uma visão de corpos celestes em desordem total recorre no “Creme 21” de Eve Heller. Reunindo imagens em movimento encontradas em longas metragens e filmes educativos antigos, o filme de Heller começa e acaba com uma visão de túnel do espaço. Do estado suspenso de um astronauta, regressamos à Terra, sombras fugazes animam quartos, um homem coberto de lama põe-se de pé. Dois olhos abrem-se, hesitantes; vemos como eles começam a ver. Depois do prólogo mudo a preto e branco, entram o som e a cor. Curtos fragmentos de música e comentários falados são juntados para formar uma colagem, acompanhados pelos cliques discretos de perto de mil pontos de montagem ligados com fita - uma sinfonia de frases estilhaçadas e de colagens sonoras sintéticas/exóticas. “Times” (tempos) é a primeira palavra que Heller isola, “entropia” e “universo”, “energia” e “gravidade” são outros conceitos centrais. O cinema é usado para despedaçar passagens predeterminadas de tempo, interferindo com cronologias estabelecidas. O brilho vermelho, azul e violeta das imagens do filme mostra paisagens desertas e formas circulares, um atleta de trampolim, uma proveta de vidro em que um borrão de tinta se espalha descontinuamente, um brinquedo-robô rétro vai desfazendo castelos de cartas com o seu andar pesado. Vemos números, setas, mecanismos de corda, instrumentos de laboratório dos anos 70, diagramas psicadélicos, desenhos experimentais surreais em câmara lenta e (aparentemente) em tempo real. Heller interliga natureza e ciência e expõe o universo à compreensão das máquinas. “Creme 21” termina no espaço interplanetário como uma composição onírica, lógica, cósmica, uma ficção científica vanguardista sobre os prazeres do cinema analógico. “O que é o ‘agora’?”, ouve-se a voz de uma mulher perguntar – ao que o filme responde friamente “O ‘agora’ é sempre aquele instante que acabou de perder”.